por Miguel Bastos, em 10.08.20
“Existe um lado bom em pertencer a um povo que foi colonizado”, disse-me um dia Waldemar Bastos, “que é poder conhecer bem a cultura do colonizador, sem perder as raízes da sua própria cultura”. Penso sempre nesta frase de Waldemar Bastos quando sinto, à minha volta, que muitos portugueses lamentam o facto de não terem nascido americanos ou ingleses. Eu gosto de pensar que tenho sorte. Eu conheço-lhes os Doors ou os Beatles. Eles não fazem ideia de quem é José Afonso ou Sérgio Godinho. Perdem eles.
Conheci Waldemar, num disco dos Heróis do Mar, e nunca mais parei de o ouvir. Foi a partir de “Africaninha” que cheguei à “Velha Chica” e percebi que, afinal, a canção dos Heróis era uma espécie de sequela do tema que Waldemar cantou com Martinho da Vila (num álbum-estreia que contava com Chico Buarque). A partir daí, passei a estar atento àquele angolano de voz triste e doce. À forma como misturava a música da sua Angola, com outras músicas de África, de Portugal, do Brasil, do mundo inteiro. Mundo que passou, depois, a conhecê-lo. Sobretudo, depois de David Byrne ter editado a sua música no final dos anos 90, em plena euforia da chamada “world music”.
Waldemar Bastos é um artista extraordinário. Continua a ser. Morreu hoje, aos 66 anos.