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Tár

por Miguel Bastos, em 24.02.23

Estou a ouvir a 5.ª Sinfonia de Mahler e a pensar nas mãos e nos braços de Tár; no rosto e nos olhos de Tár. E na voz, no discurso, na inteligência e no brilhantismo. E, ainda, na disciplina, no rigor e na assertividade implacável da personagem interpretada por Cate Blanchett. Depois de ter saído do cinema, senti-me preenchido e atordoado. Poucos dias passados, tenho a certeza de que o filme "Tár" vai-me acompanhar, nos próximos anos. Do mesmo modo que "Amadeus", de Miloš Forman: quando ouço o "Confutatis", do Requiem de Mozart, vejo Mozart a desenhar melodias no ar e a ditar as notas a Salieri, enquanto morre. Do mesmo modo que "Brassed off" / "Os Virtuosos", de Mark Herman: quando ouço o "Adagio", do Concerto de Aranjuez, de Rodrigo, vejo a nobreza, a paixão e o desespero da banda filarmónica, na sua luta pelo direito ao trabalho e a uma vida digna.
"Pensem na 'Morte em Veneza'", pede Tár, aos músicos que ensaiam o "Adagietto", da 5.ª Sinfonia de Mahler. A música faz parte do filme de Visconti. De resto, "Tár" está cheio de referências: a maestros, a músicos, a compositores, a outras artes - o que pode fazer com que os espetadores se sintam esmagados e excluídos. Mas, essa sensação faz parte da experiência que muitos sentem: ao entrarem numa grande sala de concertos, ao contactarem com os rituais da orquestra, ao enfrentarem uma sinfonia com uma duração superior a uma hora. Esta é uma música poderosa, mas é, também, uma música muito ligada aos círculos do poder e Tár não hesita em exercer o poder, de forma quase absoluta. Tár não sabe, no entanto, que o poder que exerce, pode estar a ser questionado, minado e, até, sabotado. Ou sabe?
São poucos os filmes onde sinto que a música é bem tratada. Não é o caso deste. Sinto, até, que, em nome desse rigor, a narrativa do filme possa, aqui e ali, ter sido sacrificada. Nesse sentido, "Tár" pode, até, não chegar a ser considerado uma obra-prima (o tempo o dirá), mas é, seguramente, um filme monumental. Mais de uma hora depois, a Sinfonia n.º 5, de Mahler, recomeça na minha aparelhagem: ouve-se o som do trompete e eu regresso mentalmente, à imagem de Tár, a maestrina implacável, a entrar em palco... 

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7 comentários

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s o s a 14.03.2023

tá portanto empolgado (feliz), ainda para mais levou (ok, já lá estava )  a sonoridade para casa. 
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Anónimo a 15.03.2023

Também gostei muito do filme e da interpretação da atriz Cate Blanchett! Fantástico e enesquecível!
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Anónimo a 19.03.2023

.
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Anónimo a 19.03.2023


Escreveu isto com que objetivo?
Isto serve que quê?
Quer que se saiba que vê filmes?
Não compreendo como ficção pode ser algo monumental!
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Anonima a 20.03.2023

Não comprende que ficção possa ser monumental?
Você deve ter dificuldade para compreensão em geral, não tem? Conheci uma pessoa assim. Nunca passava em prova que tivesse interpretação de texto, interpretava mal o que os outros diziam, sempre defensiva ou hostil,  e vivia  lamentando porque nao tinha amigos. Se havia um grupinho de colegas, conversando na copa, na hora do cafezinho, bastava ela chegar perto e o todos se afastavam, com as desculpas mais esfarrapadas. Era engraçado, mas não para ela. Enfim, algo a pensar, se vc se enquadra nesse tipo de pessoa. E, sim, claro que as palavras constróem monumentos, ideologias, guerras, escrevem, interpretam a história. Imaginação e palavras, e mais ainda com os recursos do cinema... 

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