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Annie era filha única, do último diretor da PIDE. José Pedro Castanheira e Valdemar Cruz chamaram-lhe "A filha rebelde". Um exagero, decerto. Annie era, apenas, uma rapariga do seu tempo. Que não gostava assim lá muito dos chefes reacionários de Portugal. E que gostava um bocadinho lá muito dos chefes revolucionários de Cuba. Apaixonou-se, fugazmente, pelo guerrilheiro Che Guevara. Namorou, prolongadamente, com um ministro do Interior chamado Abrantes. Fora isso, tudo como dantes? Não. Porque, entretanto, também houve uma revolução em Portugal. E os filhos da revolução mandaram o pai, Silva Pais, para uma prisão que ele bem conhecia: Peniche. A vida de Annie dava um filme. Dava. Para já, deu um livro (um excelentíssimo livro!) e uma série (que começa, hoje, na RTP).
O arquiteto Manuel Aires Mateus foi distinguido com o Prémio Pessoa 2017. A entrevista, deste fim de semana, no Expresso, é uma delícia. Gosto da forma como fala da sua família (o avô, os pais): entre o pragmatismo e o espírito artistico; entre o salazarismo e a extrema-esquerda. Da forma como fala do seu irmão Francisco, que também é arquiteto, mas possuidor de vários talentos. É impossível separar a sua vida, da sua arquitetura ligada à terra: tem muita obra no estrangeiro, mas a sua obra, diz o arquiteto, é sempre "daqui".
E a sua vida também é aqui. "O que é que verdadeiramente lhe interessa na vida?", pergunta-lhe o jornalista Valdemar Cruz. "A vida", responde, "Adoro viver". E acrescenta: "Mas sou uma pessoa de uma banalidade extrema. Cresci, estudei, casei aqui, tive os meus filhos aqui." Num país mediano, onde todos querem ser excecionais, há um arquiteto, que é dos melhores do mundo, que diz "Adoro tudo aquilo que as pessoas adoram, mas ao mesmo tempo adoro sentar-me aqui e ficar aqui a pensar".