Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Alegria da pobreza

por Miguel Bastos, em 18.04.24

germano 2.JPG 

"Nem a alegria da pobreza", nem a elegia da riqueza. Germano Silva - o decano dos jornalistas - apresentou-se no programa "Primeira pessoa", de gola alta. Quando era criança, Germano queria ter uma camisola de gola alta. Pedia uma camisola de gola alta, ao menino Jesus. Mas, o menino Jesus nunca lhe trouxe uma camisola de gola alta. Germano achava que talvez fosse porque ele vivia numa casa muito, muito pobre. Não há alegria na pobreza. Pior, há um sentimento de culpa, que é triste. Muito triste. Porque os pobres - que já não bastava serem pobres - ainda tinham de pedir desculpa, por serem pobres, e carregar a culpa de serem pobres. Depois de ter sido várias coisas, Germano tornou-se jornalista e deixou de ser pobre, sem passar a ser rico. Germano tem dinheiro, para uma camisola de gola alta. "Agora tenho", diz ele, a atirar um sorriso à Fátima Campos Ferreira. Ao mesmo tempo, fala de "memórias gratificantes" da sua infância, pobre, em várias ilhas do Porto. Estive a rever o programa (que maravilha!). Fiquei mais rico.

Autoria e outros dados (tags, etc)

 Até já

por Miguel Bastos, em 15.09.23

20230627_181713.jpg

Quando fez 60 anos, a norte, a minha RTP escreveu o nome dos seus trabalhadores na parede. O meu nome está lá. E não está só, está bem acompanhado. Tenho orgulho de ter o meu nome escrito naquela parede, no local onde trabalhei quase 8 anos. Vou continuar a trabalhar na Rádio e Televisão de Portugal, apenas mais longe desta parede. Portanto, não há motivo para dramas. Eu é que sou um lamechas, agarrado às pessoas e aos locais onde habito. Onde tenho habitado. Trabalhado. Se pensar bem, a minha casa continua a ser a mesma - a Rádio Pública - só mudo de turma. Já nos encontramos, no recreio. Até já.  

Autoria e outros dados (tags, etc)

As bruxas

por Miguel Bastos, em 16.03.23

bruxas.jpg 

A Segunda Guerra terminava e começava uma nova. A Guerra Fria fez crescer o medo do comunismo e trouxe um clima de paranóia, vigilância e perseguição para o interior dos Estados Unidos. Os mais afetados foram, sobretudo, os intelectuais e os artistas. Este período ficou conhecido como "macarthismo". O processo como a "caça às bruxas". Foi neste contexto, que o dramaturgo Arthur Miller voltou ao caso das Bruxas de Salém. A história, verídica, remete para o século XVII, quando várias pessoas de uma pequena povoação foram perseguidas e julgadas por bruxaria. Arthur Miller descreve bem o ambiente de intimidação e horror, em que uns acusam outros, em que uns são jogados contra os outros, num processo irracional e autodestrutivo.
 
Numa altura em que a qualidade da democracia é ameaçada pelo crescimento do populismo, pelo poder desregulado das redes sociais, pela nova cultura do cancelamento, por novas caçadas a bruxas, o encenador Nuno Cardoso leva a peça As Bruxas de Salém, ao palco do Teatro Nacional São João, no Porto. Arrepiante. Inquietante.
 
[Fotografia: TNSJ]

Autoria e outros dados (tags, etc)

Lesboa e Puerto

por Miguel Bastos, em 09.03.23
- Olha, pai, um colega teu acabou de dizer "Lesboa".

- Já falámos sobre isso.

- As pessoas de Lisboa dizem "Lesboa", não é?

- É.

- E as pessoas do Porto dizem "Puarto" e os de Aveiro dizem "Abeiro"...

- São pronúncias.

- ... e os de Coimbra dizem... "Coimbra".

- Pois.

- São os únicos que sabem dizer, bem, o nome da sua cidade.

- Hum.

- Achas que é por ser "a cidade dos estudantes"?

- Por falar em estudantes, não são horas de ires para a escola?

- Tens razão, "bou andándo".

- Então vá, faltam menos de "treuze" minutos.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Uma casa para Eugénio 2

por Miguel Bastos, em 22.01.23

 arnaldo saraiva.jpg

Durante vários anos, os amigos procuraram uma casa para o poeta, no Porto. E encontraram uma casa, na Foz, que foi, também, a sede da Fundação.
 
A morte do poeta, há quase 20 anos, fez extinguir a Fundação e o espólio de Eugénio de Andrade deixou de ter casa.
 
"Uma casa para Eugénio" é uma reportagem do jornalista Miguel Bastos, com sonoplastia de Rui Fonseca.
 
Para ouvir: clique na imagem ou no link.

https://www.rtp.pt/noticias/cultura/uma-casa-para-eugenio_a1461353

Autoria e outros dados (tags, etc)

Os arquitetos

por Miguel Bastos, em 16.01.23

rapagao.jpg 

Normalmente, os arquitetos fazem casas e museus e teatros e hospitais e essas coisas importantes.
Mas, por vezes, são interrompidos por jornalistas.
Nesses dias, passeiam em cemitérios e jardins e tiram fotografias.
  - Importa-se? - pergunta-me o arquiteto João Rapagão.
  - Claro que não. Temos que fingir que estamos a trabalhar?
  - Acho que não é preciso.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Grande e pequeno

por Miguel Bastos, em 30.09.22

Portugal é um país grande e pequeno, ao mesmo tempo. Isso, deixa-nos confusos. Às vezes, queixamo-nos da nossa pequenez: somos mais pequenos do que uma cidade americana ou asiática. Outras vezes, somos muito grandes: é, por isso, que é tudo muito longe. Essa dualidade reflete-se em discussões como a localização do novo aeroporto de Lisboa ou a colocação de médicos e professores no "interior" (no fundo, tudo o que seja a mais de 50 km da costa). Portugal é um país muito centralista. O conceito está interiorizado, mesmo naqueles que têm um discurso descentralizador.

Trabalho numa empresa que tem Portugal no nome. Que tem muitas das qualidades e defeitos dos portugueses. Mas, que faz um esforço (nem sempre conseguido, reconheça-se) para descentralizar. É, por isso, que tem vários jornalistas espalhados pelo país. Para que possam relatar os factos da região onde estão. Mas que possam, devam e reportem realidades de outras regiões ou outros países. E fazem-no, frequentemente. São jornalistas, de corpo inteiro.

Ontem, por razões técnicas e logísticas, os noticiários da Antena 3 foram emitidos a partir de Coimbra. Haverá quem ache isso extraordinário e quem ache que isso não é assunto. Por mim, acho graça que o tipo de Aveiro - que, habitualmente, trabalha a partir do Porto - vá ali, a Coimbra, fazer uns noticiários para todo o país (para todo o mundo) numa emissão que, habitualmente, é feita em Lisboa. Pequeno e grande, ao mesmo tempo.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Janela p'ro mar

por Miguel Bastos, em 20.07.22

janela.jpg

"Na boca da barra e mesmo defronte / Daquela janela virada pr'ó mar". Lembrei-me do Tristão, neste dia feliz.

Autoria e outros dados (tags, etc)

A passada de Germano

por Miguel Bastos, em 24.06.22

germano.jpg

Tem 90 anos de idade; 65 de jornalismo; mais de 30 como cronista, no Jornal de Notícias. Oficialmente, Germano Silva reformou-se em 1996. Mas, sabemos que é, apenas, "oficialmente". Desde que se "reformou", editou mais de 20 livros. O mais recente chama-se"Porto: As Histórias que Faltavam". No prefácio, o jornalista Miguel Carvalho avisa: "E nós, se não arrepiarmos caminho para acompanhar a passada do Germano pelo Porto – e em nome do Porto –, é que ficaremos para trás." Hoje, depois da uma da tarde, na Antena 1, vou tentar acompanhar a passada do Germano. A questão não é se vou, ou não, ficar para trás. Mas antes, quanto tempo é que eu vou conseguir acompanhar o Germano antes de, inevitavelmente, ficar para trás.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Não há cura

por Miguel Bastos, em 15.03.22

cave.jpg

Chegámos ao Porto, plenos de excitação. Íamos ver o Nick Cave, ao vivo. O Carlos veio-nos esperar de carro. "Podemos pôr uma musiquinha?", perguntou ele, "não tenho é Nick Cave, em cassete". Nesse tempo, copiavam-se os discos de vinil, que tínhamos em casa; para cassetes, para ouvir no carro. Os que tinham carro, claro. O Carlos roda a chave e um solo de sax, meloso, espalha-se pelo interior do Uno. Franzo o sobrolho. "Foi o mais parecido que encontrei". Reconheço a voz rouca de Leonard Cohen e continuo a estranhar o paralelismo. Naquela altura, para mim, Cohen era uma velha glória dos anos 60, que estava a envelhecer de uma forma duvidosa, como tantos outros da sua geração. Mesmo assim, o Carlos insistia: "acompanhem-me no refrão" e o Unu, em uníssimo, passou a gritar "There ain't no cure / There ain't no cure / There ain't no cure for love". O Uno, de vidros abertos, a serpentear pelas ruas da baixa. O Uno a espalhar amor e música e poesia e tabaco, pela cidade do Porto. Depois, entrámos no Coliseu para ver e ouvir o nosso herói. Mas, Leonard Cohen não me saía da cabeça. Ao ponto de achar, na altura, que também estava na cabeça de Nick Cave. De resto, continuo a achar.

Autoria e outros dados (tags, etc)


Mais sobre mim

foto do autor


Calendário

Março 2025

D S T Q Q S S
1
2345678
9101112131415
16171819202122
23242526272829
3031

Pesquisar

  Pesquisar no Blog

Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2015
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D