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"Tudo o que queres queres, meu doce, tu tens / Tudo o que precisas, filha, tu tens / A única coisa que eu te peço / É um pouco de respeito / Quando eu chego a casa". A canção de, Otis Reading, é de 1965. Fala de trabalho e do respeito por quem trabalha, mas talvez faça franzir o sobrolho quando o cantor diz à pessoa amada que é mais doce do que o mel, para lhe lembrar, logo de seguida, que que lhe dá todo o "seu" dinheiro e pede respeito "quando eu quero, quando eu preciso". Com quem então, uma canção machista?! Se não é, parece.
Otis morreu, dois anos depois. Não teve tempo para se aperceber do rumo que a canção tomou. Um furacão chamado Aretha Franklin gravou "Respect", nesse ano, e a canção tomou um sentido completamente diferente. Aretha começa por manter grande parte da letra, apenas com pequenas intervenções cirúrgicas: o "Tudo o que queres, meu doce, tu tens", passa a "eu tenho" e o "respeito" pedido/exigido Otis ora é suavizado, pelas manas Franklin no coro, com um "just a little bit/ só um bocadinho"; ora é enfantizado, por Aretha, quando soletra R-E-S-P-E-C-T e pergunta "Tenta perceber o que isso significa para mim". A partir daqui, o caldo está entornado: já em "fade" Aretha canta "Estou cansada / Pode ser que chegues a casa / E descubras que eu já me fui embora / Eu preciso de um bocadinho de respeito (só um bocadinho, só um bocadinho)".
Aretha transformou uma simples canção, num hino contra a discriminação racial e de género. RESPECT.
PS: Já agora, também nesse ano, Aretha Franklin gravou "You make me feel like a natural woman", de Carole King. Em 2015, a compositora foi homenageada no Kennedy Center e surpreendida por Aretha, no palco. Carole, em êxtase, ao lado do casal Obama. Para ver e ouvir aqui.
https://www.youtube.com/watch?v=pT4aRd-hCqQ
Vou chorar e já volto.
Os Bee Gees já eram estrelas pop, há vários anos. Mas a coisa só começou a piar fininho (muito fininho), a partir de 1975. Foi, nessa altura, que o falsete de Barry Gibb se revelou. A verdade é que os irmãos Gibb adoravam as grandes vozes da "soul music". Em 1967, chegaram, mesmo, a escrever"To Love Somebody" para Otis Redding, mas o cantor morreu nesse ano. Em1972, outra glória da música negra, Al Green, pegou numa canção (já conhecida) dos Bee Gees e deu-lhe o toque "soul" que a canção pedia. Três anos depois, os Gibb perderam a vergonha e - apesar de serem cantores brancos, ingleses e devotos dos Beatles - decidiram abordar a música negra e emular os seus cantores. Alguns milhares não gostaram, alguns milhões renderam-se. Oficialmente, a mudança deu-se a canção "Jive Talkin'" e o álbum "Main course", mas eu acho que começou aqui. Ora ouçam: