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Tem 90 anos de idade; 65 de jornalismo; mais de 30 como cronista, no Jornal de Notícias. Oficialmente, Germano Silva reformou-se em 1996. Mas, sabemos que é, apenas, "oficialmente". Desde que se "reformou", editou mais de 20 livros. O mais recente chama-se"Porto: As Histórias que Faltavam". No prefácio, o jornalista Miguel Carvalho avisa: "E nós, se não arrepiarmos caminho para acompanhar a passada do Germano pelo Porto – e em nome do Porto –, é que ficaremos para trás." Hoje, depois da uma da tarde, na Antena 1, vou tentar acompanhar a passada do Germano. A questão não é se vou, ou não, ficar para trás. Mas antes, quanto tempo é que eu vou conseguir acompanhar o Germano antes de, inevitavelmente, ficar para trás.
Sempre que me dizem que o jornalismo português é "muito à esquerda", tendo a sorrir. O jornalismo e os jornalistas podem e devem ser criticados e escrutinados. Mas, tão ou mais importante, é saber quem detém os órgãos de comunicação social. São esses que depois escolhem administradores e diretores, que definem as políticas editoriais. A máxima "follow the money / sigam o dinheiro" - usado nas ciências políticas - aplica-se aqui, em todo o seu esplendor. E os patrões dos media estão, de modo geral, muito longe de serem "muito à esquerda". Recentemente, o setor sofreu muitas alterações: da restruturação dos grupos Impresa e Media Capital; à consolidação do grupo Cofina no setor televisivo; passando pelas transformações recentes com a entrada do grupo BEL, no grupo Global Media. É sobre este grupo (que detém o JN, o DN, O Jogo e a TSF) que o jornalista Miguel Carvalho se debruça, esta semana, na Visão: com uma investigação sobre o novo "tubarão dos media", Mário Galinha. Parece canja, mas não é.
Com o alívio das restrições da pandemia, o jornalista Miguel Carvalho regressou à estrada, para apresentar o livro "Amália - Ditadura e Revolução". Escreve o autor, nas redes sociais: "a minha Amália vai estar aqui", "a minha Amália vai estar ali". Pois bem, senhor Miguel Carvalho, deixe-me falar-lhe da minha experiência: a minha Amélia saiu da minha casa, com a sua Amália. Desapareceram, as duas, de braço dado. Estive mais de 15 dias sem as ver. Quando, finalmente, as reencontrei, a minha Amélia entregou-me o seu livro. "Já li", disse ela toda satisfeita, "o livro é muito bom". Isto poder-lhe-á agradar, sr. Miguel. A mim é que não. Anda, para aqui, um tipo consumido...
Sou um leitor com alma de decorador. Esta manhã, por exemplo, não me consegui decidir. Onde arrumar "Amália - Ditadura e Revolução", de Miguel Carvalho? Ao lado das biografias políticas de Mário Soares, Otelo Saraiva de Carvalho e Humberto Delgado? Ou junto às biografias artísticas de António Variações, Sérgio Godinho e Caetano Veloso? Podem enviar as vossas sugestões. Mas (lá está, o meu lado de decorador) também podem enviar clássicos de mobiliário de design do século XX. E é isto. Obrigado.
“E Ceausescu pede Amália”, escreve Miguel Carvalho em “Amália - Ditadura e Revolução”. Em 1975, o presidente da Roménia comunista estava de visita ao Portugal do PREC e pediu para ouvir a cantora que, por essa altura, em Portugal, era chamada de “fascista” ou “princesa da PIDE”. Antes de ser adoptada pelo Estado Novo como produto de exportação, Amália (como o fado, em geral) tinha sido alvo da sobranceria dos intelectuais do salazarismo. Com o 25 de Abril, voltou a sofrer do mesmo tipo de discriminação. Agora da bancada contrária.
Amália não precisou do 25 de Abril para atravessar a cortina de ferro. Em 1969, esteve, inclusivamente, na capital do império vermelho. Também não precisou do 25 de Abril para cantar as melodias de Alain Oulman, e a poesia de Ary dos Santos, David Mourão-Ferreira ou Manuel Alegre. Fê-lo sem olhar às convicções políticas de quem a rodeava, e isso nem sempre lhe foi reconhecido.
A perseguição política que lhe fizeram, depois do 25 de Abril, foi tão absurda como a apropriação que lhe tentaram fazer, durante o Estado Novo e, mais tarde, durante a consolidação da democracia. Amália nem sempre terá sido hábil na gestão do seu relacionamento com os poderes políticos, mas foi sempre muito hábil na gestão da sua carreira artística. E foi pelo meio artístico que foi sendo resgatada. Não pelos artistas de antigamente, mas pelos novos artistas emergentes de então: António Variações ou Carlos Paião, primeiro; Madredeus ou Dulce Pontes, mais tarde.
“Amália - Ditadura e Revolução” é um contributo rigoroso para conhecermos Amália, no contexto social e político em que a sua carreira se desenvolveu. Mas é, também, um contributo extraordinário para nos reconhecermos a nós próprios: enquanto indivíduos e enquanto portugueses.
Já 100 anos e ainda tanto por descobrir.