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Ler nas férias

por Miguel Bastos, em 26.08.24

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Durante muito tempo, não lia nas férias. Achava esquisito. Os livros levam-me para outro sítios. E eu já estava noutro sítio. E era nesse sítio que eu queria estar.
 
Para as Berlengas, no entanto, fiz questão de levar um ou dois livros. Nas Berlengas, há (mesmo) muito pouco para se fazer. De maneira que me lembro de ficar a ler, virado para o mar - a alternar as páginas, com o horizonte, a partida e chegada dos barcos, o avanço da tarde e da sombra.
 
Noutra ilha, a Ilha do Sal, em Cabo Verde, também li. Mas senti que estava a ler o livro errado, no local errado. Um livro inglês com classes sociais, industrialização, quintas, amantes, viagens pela europa, frio, chuva, casas de campo. E eu, estendido numa espreguiçadeira, a apanhar banhos de sol, de vento e de mar. Senti-me um inglês no Algarve. E não gostei.
 
Se ler é viajar, não faz sentido viajar para dois destinos diferentes em simultâneo. Não ler é sempre uma opção. A outra, requer uma boa combinação entre o que se lê e o local para onde se vai.

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Deus sorri

por Miguel Bastos, em 14.06.24

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A coisa foi feia, com mortes que só podiam ser crimes e que estavam a minar a igreja, por dentro. Era preciso resolver o assunto. E foi, por isso, que chamaram William de Baskerville, que resolveu o mistério. A tragédia radicava, afinal, na comédia. O riso, defendeu o velho Jorge de Burgos - guardião da biblioteca e da moral - cria dúvidas e afasta o medo. E sem medo, não há temor a Deus. E sem temor a Deus, não há crença, nem religião.

Umberto Eco escreveu "O nome da Rosa", há 40 anos. Esta manhã, o Papa Francisco chamou humoristas de todo o mundo. Para lhes dizer que "quando vocês fazem alguém sorrir, Deus também sorri". Sem medo.

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Erros meus

por Miguel Bastos, em 11.06.24

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- Ólhó Luis Vás!
- Olá.
- Gostas-te da festa dontem?
- Isso está cheio de erros, sabias?
- Ya, "Erros meus, má fortuna" e coiso e tal...
- O que é que estás a fazer?
- Tou a chatear o Camões...

 

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Dia Mundial do Teatro

por Miguel Bastos, em 27.03.24

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Ó Molière, não me leves a mal, mas tens de ter mais cuidado.
Às vezes, acho que fazes tudo às três pancadas

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Miúdos

por Miguel Bastos, em 25.03.24

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Sim, este livro tem sexo, drogas e rock and roll. Tem muito de tudo isso. Mas não foi isso, que mais me marcou. Foram outras coisas, como o desejo de ser artista (sem saber, ainda, de que arte) e a ternura entre os dois aspirantes a artista. Este livro é (mesmo!) sobre dois miúdos: os seus gostos, desejos, aspirações, sonhos. E é, sobretudo, sobre a relação entre os dois. Por isso, o maior êxito na carreira de Patti Smith (a canção "Because the night", escrita em parceria com Bruce Springsteen) é despachado em duas linhas. Já uma simples prenda de Robert para Patti pode espreguiçar-se por várias páginas, com descrições pormenorizadas sobre uma camisa em segunda mão, comprada por tuta e meia, numa loja manhosa, mas embrulhada num papel especial e amarrada com uma fita de um tecido raro. Esta ternura é uma espécie de flor, a romper na dureza da selva urbana. "Apenas miúdos" tem a beleza e a dureza das coisas nuas e cruas.

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Portugal ao espelho?

por Miguel Bastos, em 12.03.24

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Antes, durante e depois da revolução. A saga de uma família, ou de um país? Ou de vários países, dentro de um mesmo país? Esse país, ainda existe?

"Revolução", de Hugo Gonçalves, conta a história de três filhos, muito diferentes entre si. A mais velha, militante do PCP, foi presa pela PIDE. Abandona o PCP, para se radicalizar, à esquerda. A irmã tem um perfil conservador, que parece conviver melhor com o salazarismo, do que com os tempos conturbados do PREC. O mais novo vive num mundo interior e hedonista, com contactos esporádicos com a irrealidade daqueles anos. Os três são filhos de uma mulher, aparentemente conservadora, outrora mãe solteira, que ascende socialmente pelo trabalho e pelo casamento com um homem de hábitos aristocratas e sobrenome estrangeiro. "Storm" é um nome que antecipa a tempestade perfeita, num país prestes a rebentar - pelas costuras e pelas bombas da extrema-esquerda, das Brigadas Revolucionárias, e da extrema-direita do ELP - Exército de Libertação de Portugal.

Confesso que, ao fim das primeiras páginas, dei por mim a desejar mais literatura e menos Hollywood. A linguagem, o ritmo, a estrutura narrativa - com vários coisas a acontecer ao mesmo tempo e "flashbacks" e "fast fowards" - começavam a irritar-me. Afinal, queria ler um livro. Não queria ver um filme, nem uma série. Acabei a ler um país: trágico, cómico, violento, complexo, contraditório. Um país que continuo a descobrir. Que permanece por descobrir.

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Revolução

por Miguel Bastos, em 06.03.24

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Revolução na lavandaria

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Empregado do dia

por Miguel Bastos, em 22.01.24

Momento empregado de mesa do dia.
- Bom dia!
- Bom dia! Como é que que se chama?
- Lia.
- Lia?
- Sim.
- Porquê, já não lê?

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Jornalismo e jornalistas

por Miguel Bastos, em 10.10.23

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O livro "4 3 2 1", de Paul Auster, está cheio de referências ao jornalismo e aos jornalistas.
 
"Ser jornalista significava que nunca podíamos ser a pessoa que atirava pela janela o tijolo que começava a revolução. Podíamos ver o homem a atirar o tijolo, podíamos tentar perceber porque é que ele tinha atirado o tijolo, podíamos explicar aos outros a importância do tijolo no início da revolução, mas nós próprios nunca podíamos atirar o tijolo ou mesmo fazer parte da multidão que incitava o homem a atirá-lo. Por temperamento, Ferguson não era uma pessoa inclinada a atirar tijolos. Era, esperava ele, uma pessoa mais ou menos razoável, mas as agitações daquele tempo eram tais que os motivos para não atirar tijolos começavam a parecer cada vez menos razoáveis, e quando finalmente chegasse o momento de atirar o primeiro, a simpatia de Ferguson estaria com o tijolo e não com a janela."

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Esquecimento

por Miguel Bastos, em 20.07.23

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Quando um escritor morre, tendemos a voltar à sua obra. A pensar nela e no seu autor. Faz parte de um certo processo de luto. No caso de Milan Kundera, quase toda a gente se lembrou de "A insustentável leveza do ser". Eu também. Acrescentei "A Valsa do Adeus", "A Imortalidade" e "Livro do Riso e do Esquecimento". Detive-me na palavra "esquecimento". Constatei que, para além dos títulos, não me lembrava dos livros de Kundera. Esquecimento. Abri, por acaso, "A Imortalidade".
 
"Estou na cama, mergulhado na doçura de um semi-sono. Às seis horas, depois de um primeiro e leve despertar, estendo a mão para o pequeno transístor poisado perto da minha almofada e carrego no botão. Ouço as notícias da manhã, quase a distinguir as palavras, e adormeço de novo, enquanto as frases que ouço se vão transformando em sonhos. É a fase mais bela do sono, o momento mais delicioso do dia: graças à rádio, saboreio os meus perpétuos despertares e adormecimentos, essa oscilação entre a vigília e o sono, esse movimento que por si só me livra do desgosto de ter nascido."
    
Com que então, rádio?! Como é que não me lembrava? Não sei. Avanço n' "A Imortalidade" e percebo que a rádio veio para ficar no romance. Eu também. Experimento "despertares e adormecimentos" em diferentes camas, sabendo que, daqui, não saio tão cedo.
 

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