Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
A Susana andava louca pela Madonna. Elogiava-lhe o estilo, a dança, o ritmo, as melodias, as letras. "As letras, Susana?!", perguntei-lhe. "Sim", respondeu-me, "ela tem letras espetaculares". Eu tentava a minha melhor imitação do "Like a virgin" e desdenhava da Madonna a imitar a Marilyn Monroe no "Material girl". "Já ouviste o novo disco?", perguntou-me. "Ainda não, mas também não tenho pressa". E ela: "Tens que ouvir o 'Papa don't preache'". "Ai, sim?". "Sim, fala de uma miúda que engravidou e quer ficar com o bebé. É uma mensagem muito importante para as raparigas". "Certo", concedo. Nem todas as raparigas são como a Susana: forte, decidida, senhora do seu nariz. Senhora do seu corpo todo. "Sabes, Susana, podias ouvir outro tipo de raparigas: a Siouxsie (Susan / Susie) Sioux, por exemplo. Para além de ter o teu nome, é muito mais parecida contigo". E era: o cabelo preto, a postura, a garra, a atitude. "Eu não gosto muito dessas coisas: gótico, punk e não-sei-quê". A pouco e pouco, a Susana foi desaparecendo. Não a voltei a ver. Contaram-me que o pai a encontrou, à noite, no quarto, com um bebé sobre a barriga.
Mais álcool. Mais tabaco. Mais peso.
São consequências da pandemia, que afetaram, sobretudo, os jovens - refere um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Eu - que não fumo e quase não bebo - devo celebrar a minha perda de peso, ou lamentar a minha perda de juventude?
"Pago já", dizia o cartaz, "ou é melhor pedir um orçamento?" Todos se riram, menos eu. Não percebi a piada. Explicou-me um dos candidatos da lista C: o atendimento, no bar do liceu, estava cada vez pior; os preços estavam sempre a mudar; o pré-pagamento obrigatório era uma descriminação. Daí a piada: "percebeste"? "Mais ou menos", respondo. Faltava-me perceber a palavra "orçamento". "Acho que é a fatura", dizia o Zé. "Não, acho que é a senha", dizia o João. "Não é a mesma coisa?" "Não, porque a fatura pagas depois". "E a senha?", insistia o Zé. "A senha pagas antes". "E o orçamento?", perguntei. "Então, o orçamento..." Continuava sem perceber o significado, mas já dava para ver que não era o único. "A ideia", insistia a consciência política do grupo, "é gozar com a burocracia do bar, percebeste?" "Acho que sim", disfarcei. Agora, tinha mais uma palavra para descobrir no dicionário: "burocracia". Agora, que é como quem diz. Agora, estava demasiado entretido com um pastel de carne, ainda quente, acabado de sair do forno. Continuava sem saber o que era o orçamento. Mas percebi, logo, que era algo que não se devia decidir a quente.
O destino é dado a ironias. Esta tarde, apanhou-me num banco de jardim, a ler umas coisa sobre o pântano. Lembram-se do pântano? Foi quando Guterres saiu do governo e Portugal entrou numa fase gloriosa da sua história: um governo de Durão Barroso; uma cimeira com o "George" nas Lajes; uma ida para o Iraque; outra para Bruxelas; um governo de Santana; outro de Sócrates; outro, ainda, mais do mesmo - mas (ainda) mais arrogante; o regresso de Cavaco; uma troika; um governo para além da troika. Ai, saudades do futuro! Esta tarde - dizia eu - estava a ler umas coisas sobre o pântano e o telemóvel alerta-me para a conferência de imprensa do secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para reagir ao chumbo anunciado do Orçamento, depois das tomadas de posição do Bloco e do PCP.
E estou eu a olhar para o telemóvel, quando passa por mim um grupo de jovens ativistas, vestidos de preto da cabeça aos pés. Os tempos estão difíceis e os jovens são o futuro. Ah, os jovens! Gritam, a plenos pulmões, palavras de ordem que não consigo decifrar. Seguem-se outros jovens que, primeiro, dançam a Macarena, e, depois, colocam-se de gatas, porque os tempos são de solidariedade e integração. "O país está de tanga", dizia Durão. Agora está de gatas, mas de máscara. A integração segue as normas da DGS, indiferente ao Orçamento. Os jovens são o futuro, negro. Vai ficar tudo bem. E vamos sair mais fortes. Para onde? Não se sabe, talvez em direção ao pântano. Ai, saudade!
Melhor do que pobre e feio, é ser bonito e rico. É o caso de David Walliams, famoso pelos namoros com modelos, pelos programas de talentos, pelas revistas sociais. David é uma espécie de Ricardo Araújo Pereira: só que mais rico, mais elegante, mais famoso, mais popular, mais talentoso. O comediante genial de "Little Britain" é, também, um escritor de livros infantojuvenis. E é nessa qualidade, que é apreciado aqui em casa. David não escolheu o caminho mais fácil: no primeiro livro, aborda questões de género; no segundo, a amizade entre uma criança e um sem-abrigo, num outro um velho com demência. Em vários, foca a relação especial que pode existir entre os mais novos e os mais velhos, com uma graça e uma ternura invulgares. Não são os temas mais habituais, no universo da literatura infantil. Temas que ele aborda, de forma, simultaneamente, desconcertante e divertida.