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"O Crepúsculo da Democracia" começa como se fosse um filme. Uma festa de Ano Novo, em 1999, numa casa de campo na Polónia. Dezenas de pessoas - vindas de Moscovo, Nova Iorque, Londres ou Varsóvia - preparam-se para celebrar a chegada do ano 2000 com otimismo. Pensei nos filmes de guerra. As pessoas a divertirem-se ou a discutir futilidades, ignorando que as bombas e os soldados já estão próximos. Os últimos momentos de alegria, antes do confronto violento.
E é mais ou menos isso que se segue. Escreve a autora: "Volvidas quase duas décadas, eu atravessaria agora a rua para evitar algumas das pessoas que foram à minha festa de Ano Novo. Elas, por seu turno, não só se recusariam a entrar na minha casa como teriam vergonha de admitir que alguma vez lá tinham estado. Na verdade, quase metade das pessoas que foram àquela festa não falaria com a outra metade." As pessoas que estavam na festa eram "de direita": conservadores e liberais, admiradores de Thatcher, defensores da NATO, do mercado livre, da União Europeia, da democracia. Uma direita otimista e triunfante, que confiava nas instituições. Que combatia a esquerda, dentro das regras. Muito diferente de uma certa direita, que não é nova - porque tem demasiadas coisas parecidas com a antiga.
Anne Applebaum aborda a forma como a direita autoritária e populista chegou ao poder na Hungria e na Polónia, mas também nos Estados Unidos onde, hoje, se assiste ao regresso de Donald Trump à presidência. Anne descreve as táticas que os protagonistas desta direita usam para desgastar as instituições democráticas. Como usam, de forma quase científica, a calúnia e a mentira. Como inventam teorias da conspiração e campanhas de difamação. Como agitam medos e inventam ameaças. Como prometem o regresso a um passado que nunca existiu. Como defendem uma coisa e o seu contrário. Como defendem uma coisa e fazem outra. Como lutam pelo poder, apenas para exercerem o poder. Os valores e a ideologia têm muito pouco a ver com este contexto. Razão, pela qual, os partidos tradicionais têm tido muitas dificuldades em irem a jogo. Porque vão com as regras da democracia para um combate sem regras.
Apesar do retrato traçado, recorrendo a casos e períodos históricos, em que a democracia esteve em perigo, ou foi, mesmo, derrotada, a autora consegue, ainda assim, deixar uma nota de esperança. "O Crepúsculo da Democracia" é uma excelente reflexão sobre os tempos em que vivemos.
"O populismo faz parte da democracia?", perguntou o jornalista António Jorge, esta manhã, na Antena 1. "Faz", respondeu António Costa Pinto, "A maioria das democracias não são derrubadas por golpes de estado e revoluções. São derrubadas a partir de dentro". E deu os exemplos recentes dos regimes autoritários e populistas da Polónia, da Hungria e da Turquia. O historiador e politólogo não teve dúvidas: a invasão do Capitólio não foi uma ação folclórica de um grupo de radicais de extrema-direita, foi organizada a partir da presidência. E isso, justificará a falta de reação das forças de segurança. Afinal, Trump ainda é presidente e, como tal, responsável máximo das forças armadas. Trump, como todos os líderes populistas, gosta de lei e ordem: mas só quando lhe convém. Já agora, uma coincidência trágico-cómica: a invasão do Capitólio decorreu no mesmo dia em que Marcelo Rebelo de Sousa e André Ventura debatiam as diferenças entre a direita social e a direita securitária.
Parece que, para muita gente, discutir a ameaça do populismo e do nacionalismo é uma coisa muito esotérica: "ah, os valores e tal"; "pois, os princípios e coiso"; "sim, os pobres e as minorias". Vamos a coisas concretas: esta semana, os governos da Polónia e da Hungria (e, agora, da Eslovénia) decidiram vetar 750 mil milhões de euros, para a Europa fazer frente ao impacto económico da Covid-19. Uma retaliação pelo facto da Europa sublinhar valores como a democracia e a liberdade. Mais concreto, ainda: com isso, os governos da Polónia e da Hungria bloquearam 15,3 mil milhões de euros a Portugal. A mim, parece-me que é muito dinheiro. Talvez, por ser um idealista. Seguramente, por ser um teso.
Primeiro, a Europa fez de conta que não viu. Depois, era um problema dos países do sul. Quando os refugiados chegaram, em massa, a França e à Hungria a coisa começou a mudar. Em França, os refugiados perceberam que a “Igualdade, Liberdade e Fraternidade” tem dias e que, do outro lado de Calais, não há oásis, só mau tempo no canal. Na Hungria, deram de caras com um líder político que, de urbano, só tem o nome. Orban ergueu um muro, esquecendo que já esteve do outro lado de um.
Cameron não se distingue muito. Como Orban, gosta de estar com um pé dentro e outro fora da Europa e lembra que o seu reino não tem espaço para Schengen. Angela Merkel tem estado sozinha e também veio dizer “já Schengen”. A poderosa Alemanha não consegue convencer os parceiros europeus a receber refugiados e também fecha as fronteiras.
A Europa não tem memória, nem pensamento, nem discurso, nem liderança. Tem porteiros.
“Já Schengen” é a resposta da Europa à Crise dos Refugiados. O último que feche a porta.
Enquanto os italianos acodem os imigrantes, no mediterrâneo, os franceses fecharam as fronteiras. Em França, esse farol de liberdade e de socialismo Holland(ês), ainda se tem o descaramento de dizer que o problema da emigração é italiano. Bravo Ambrósio!
Se os franceses podem fechar fronteiras, porque é que os húngaros não hão-de poder? O governo, de Viktor Orban, teve a ideia brilhante de ressuscitar o muro, para separar a Hungria da Sérvia, de onde vem muita gente à procura do espaço Schengen. O muro terá quatro metro de altura e 175 km de comprimento. Sabe a pouco. Deviam-se fechar os mais de 2 mil km de fronteira e transformar a Hungria numa ilha pura - com pena de morte, e sem os ciganos e os imigrantes, que tanto incomodam o primeiro-ministro.
Orban deve-se ter esquecido para que é servia o outro muro. Nessa altura não viajava muito. Agora, sim. Numa das suas última viagens encontrou-se com o presidente da comissão europeia. Juncker cumprimentou-o com um espirituoso “Olá ditador!” John McCain (esse grande esquerdista) já tinha sido mais directo: é um neofascista! A Europa mete medo…