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Pelo que percebi, o embaixador de Israel na ONU pediu a “demissão imediata” de António Guterres, porque percebeu que Guterres é (mesmo) Secretário-Geral das Nações Unidas. Não é Secretário-Geral de Israel, nem da Palestina, nem da NATO, nem da União Europeia, nem do G7, nem da Web Summit. É de todos.
Muito gira a versão mexicana do "Querido Mudei a Casa".
"Gosto e reivindico a capacidade de me comover". Jorge Sampaio rejeitava, assim, a imagem que lhe colocavam do político palavroso, intelectual, frio e distante. A culpa, dizia o próprio, era da cor do cabelo, que não disfarçava a ascendência britânica. Jorge Sampaio teria características dessa herança familiar: metódico, polido, educado, disciplinado, assertivo. Mas era também latino: afetuoso, sentimental, empático, solidário. Esta manhã, na Antena 1, uma antiga assessora referia que o (então) Presidente da República avisava sempre: não lhe pedissem para ser algo que ele não era; nem para dizer coisas que ele não sentia, nem concordava. O que, em política, não costuma dar bons resultados: nem eleitorais, nem de popularidade. Quando José Sócrates chegou à liderança do PS, Mário Soares chamou-lhe o "anti-Guterres". Jorge Sampaio terá sido o "anti-Soares". Não tinha as características que todos os políticos "têm" de ter: porque não queria ter, nem fingir que as tinha. Colocou-se, como era, à disposição do escrutínio e do sufrágio públicos. Prontificou-se a perder - se fosse necessário. Por vezes, perdeu. E, desse modo, a democracia ganhou sempre. Adeus.
No meio do entusiasmo à volta de candidatura de Guterres à liderança da ONU, houve conjunto de pessoas “cosmopolitas” que resolveu criticar os “patrioteiros”. É verdade, o futuro de Portugal não depende da eleição de Guterres. Ter Guterres, como secretário-geral da ONU, não vai provocar a recuperação das finanças públicas, nem o crescimento económico, nem vai baixar o desemprego. Não vai aumentar a qualidade da governação, nem da oposição. Não vai acabar com o crescimento da extrema direita na Europa. Não vai decidir as eleições nos Estados Unidos. Não vai acabar com as brincadeiras perigosas da Coreia do Norte. Nem com a guerra na Síria. Mas se for búlgaro, alemão ou russo, também não.
Os “cosmopolitas” não acham relevante ter, pela primeira vez, um português à frente das Nações Unidas. O que é importante é que ganhe o melhor. Mas não dizem qual é o melhor. Não importa se Cristiano Ronaldo é português. Nem Pessoa, Camões, Amália, Saramago, Damásio, Vasco da Gama. Porque o mundo é um só. Porque são “cosmopolitas”. Os “cosmopolitas” não são bem cosmopolitas. São apenas parvos.
Kristalina Georgieva pediu folga ao patrão para ir para a ONU. O patrão deu folga e, até, encorajou Kristalina… Angela Merkel apoia. Portugal espanta-se. Guterres já venceu cinco batalhas, mas arrisca-se a peder a guerra. Marcelo diz que Kristalina parece uma atleta que entra para a maratona, a 100 metros do fim. Mas lembra que Guterres é um "maratonista natural". Felizmente, Portugal tem tradição na maratona.
Mas anda batota no ar, lembrou-nos Freitas do Amaral - homem que percebe de ONU. Kristalina veio substituir a candidatura de Irina Bokova, a anterior búlgara de serviço, que perdeu todas as votações. Na segunda-feira, Kristalina vai ser ouvida na ONU. Não se sabe para que é que serviram as votações informais anteriores. Só se "votação informal" significar “votar, até vencer o que eu quero”.
Antigamente, havia a Cristalina. Uma laranjada honesta: xarope de açúcar, ácido citrico e sumo de fruta. Era uma refrefrigerante hidro-carbo-gaseificado… Não era sumo detox. Nós sabíamos isso. Era claro como a água. A candidatura de Georgieva não é Kristalina. É turva.
Ter um antigo e um actual Presidente da República Portuguesa a apoiar a candidatura de um antigo primeiro-ministro, a secretário-geral da ONU, é (sem ironias) uma coisa linda de se ver. O antigo Presidente (Jorge Sampaio) foi rival de António Guterres no PS. O atual (Marcelo Rebelo de Sousa) foi líder da oposição, quando Guterres foi primeiro ministro. E antigo e o atual Presidente foram adversários nas eleições à Câmara de Lisboa. Nem um, nem outro, hesitaram no apoio a Guterres. Os três conhecem-se há várias décadas. E unem esforços, em termos políticos e pessoais, a favor de Portugal.
Sampaio trouxe consigo o empenhamento na defesa dos refugiados sírios. Marcelo fez um bom discurso. Exagerou (quando evocou Gandhi e Mandela), mas esteve bem na evocação das qualidades do candidato e das qualidades do país. Somos um país pequeno, periféricos, etc. Mas isso, não é uma maldição. Pode, até, ser uma vantagem para este tipos de cargos. Termos jornalistas franceses que não sabem quem é Marcelo, não tem mal nenhum. Alguém, em Portugal, sabe o nome do chefe de Estado da Finlândia ou da Lituânia?
Se não servir para mais nada, a candidatura de Guterres a secretário-geral das Nações Unidas, servirá, ao menos, para mostrar que se pode melhorar a política portuguesa, a partir de dentro. E que se pode trabalhar em conjunto. Basta ter objectivos e desígnios comuns. Não faltam oportunidades.
Já temos, finalmente, uma explicação para o caso Barroso. O antigo presidente da Comissão Europeia perdeu o direito à passadeira vermelha. Paulo Rangel tem a explicação: a Comissão Europeia está a tentar prejudicar a candidatura de António Guterres para secretário-geral das Nações Unidas. Rangel (que foi braço direito de Rui Rio, candidato à liderança do PSD e é eurodeputado e vice-presidente do PPE) não encontra outra explicação para a forma como Durão Barroso está a ser tratado. É verdade, eles não querem saber de Durão Barroso. Nem querem saber da Goldman Sachs. Eles querem é prejudicar Guterres. Eles querem é prejudicar Portugal.
Eu iria mais longe. Depois de terem dado o Mundial 2018 à Rússia, em vez de Portugal, eles não querem a selecção portuguesa no Mundial. E eles sabem que nós somos favoritos. E ninguém me tira da cabeça que esta história foi tornada pública na véspera do Benfica - Besiktas (reparem no empate). Parece que gostam mais dos Turcos e de Erdogan, do que de nós e o nosso Guterres. E esta semana há Real Madrid - Sporting e Porto - Copenhaga. Estão a ver a ligação? Querem-nos atirar para fora da Europa e do mundo, é o que é. Durão é só um pretexto. E o mais incrível, é que Rangel é o único a ver isso.