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Parece que passou despercebido, à maioria dos comentadores. O mercado de inverno fechou, com uma das maiores transferências de sempre: Gustavo Dudamel trocou a Filarmónica de Los Angeles, pela Filarmónica de Nova Iorque. Gustavo, venezuelano, 42 anos, filho da pobreza e da utopia do "El sistema", vai ser maestro titular, a partir da temporada 2026/27, da orquestra que já foi dirigida por Leonard Bernstein e outro Gustavo: Mahler. Quando chegou a Los Angeles, há mais de 10 anos, teve direito a jornalistas, multidões e celebridades. Uma coisa à americana: "Bienvenido Gustavo". Tudo indica que, agora, o fenómeno se vai repetir. Estive a recordar alguns artigos de imprensa, "trailers" promocionais , entrevistas, conferências de imprensa. Numa delas, perguntavam a Dudamel que música é que ele gostava de ouvir: "Beethoven, Mahler, Schostakovich...". E ouve música popular? "Claro, eu adoro tango, merengue... Astor Piazolla, Juan Luís Guerra...". "Eu estou a pensar em música americana", insiste o jornalista. "Eu também", responde o maestro a sorrir. Ele veio da terra de Simón Bolívar, o libertador.
Recordo a passagem da Orquestra Juvenil da Orquestra Simón Bolívar pelo Royal Albert Hall, nos BBC Proms de 2007. "Eles podiam ter trazido Mahler ou Beethoven", diz a locutora da BBC, "mas preferiram mostrar quão boa é a música deles". Nessa noite de glória, a Orquestra tocou vários compositores da américa latina e as "Danças Sinfónicas de West Side Story", de Bernstein. O compositor tornou-se indissociável da orquestra e de Dudamel. Foi ele a assinar a direção musical da versão mais recente do musical de Bernstein, realizada por Steven Spielberg. É ele que vai dirigir a Orquestra que já foi de Bernstein. É ele que tem levado a música dos compositores latino-americanos, ao mundo inteiro: entre eles, Heitor Villa-Lobos. É ele que que faz cantar a língua portuguesa, nos melhores palcos do mundo. Bravo, Gustavo!
Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto
"No filme 'A Lista de Schindler'", recorda o compositor John Williams, "há uma cena em que um violinista, judeu, entretém um grupo de oficiais nazis. Então, eu disse ao Steven 'seria bom termos um violinista' e pensei, logo, no Itzhak. Ele veio ter connosco e viu uma parte do filme, mas começou a ficar tão emocionado que disse 'eu não consigo ver mais, o melhor é começarmos a tocar'". E tocou. E, desde então, não parou de tocar. Onde quer que vá - da América do Norte, ao Extremo Oriente; do Norte da Europa à África do Sul - pedem sempre a Itzhak Perlman que toque esta peça.
Aqui, tocou-a num concerto de homenagem a John Williams, com a Orquestra Filarmónica de Los Angeles, dirigida pelo maestro Gustavo Dudamel. Aqui, ele toca-nos. Uma vez mais.
A música orquestral deve ser interpretada, em palco, por pessoas de meia idade, para uma plateia de gente culta, em países envelhecidos e ricos. Dificilmente, rapazes e raparigas jovens terão lugar numa orquestra como deve ser. Sobretudo, se forem pobres e latinos. Essa gente veste fato de treino, e é boa para bater palmas e tocar batuques, mas não para tocar numa orquestra. Por favor, não vejam isto até ao fim. Ainda vos dá vontade de dançar e, depois, lá fica o "comsommé" entornado.
Dizemos, muitas vezes, que uma música ou um artista nos salvou a vida. É, obviamente, uma metáfora, um exagero. Mas, para o maestro José Antonio Abreu, salvar a vida era mais do que uma figura de estilo: transformou-se numa missão. Abreu fundou o "El Sistema": um sistema para salvar as crianças pobres da Venezuela, através da música. Uma rede de escolas, orquestras e coros que se foi espalhando pelo país. Centenas de milhares de crianças e jovens, saíram de meios de pobreza extrema - ligados à droga e à criminalidade - e chegaram aos maiores palcos do mundo. E apaixonaram os maiores maestros do mundo. E geraram um dos maiores maestros do mundo: Gustavo Dudamel.
Ei-los a celebrar "Mambo", de Leonard Bernstein. O tema faz parte do musical West Side Story: uma variação de "Romeu e Julieta", em que dois grupos rivais de jovens delinquentes (um deles latino) se digladiam nas ruas de Nova Iorque. No fundo, o meio de onde vieram os músicos e a música que estão em palco. "Mambo", no Dia Mundial da Música, a salvar a vida: a deles, mas também a nossa.