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A partir de amanhã, vai estar tão bom tempo, tão bom tempo, que já há avisos de "Cuidado com os agueiros", "Evite sardinhadas junto a espaços florestais" ou "Sr. Eduardo vista a camisola, por favor, para disfarçar a barriga". Vai estar tão bom tempo, dizia eu, tão bom tempo, que dei por mim a fechar o casaco, a abrir o guarda-chuva e a pensar "nunca mais é sábado".
Ao saber que as chamas rodeavam o aldeamento de luxo, o comentador questionou a importância do ordenamento da floresta. Sim, defendeu, porque o empreendimento estava bem ordenado, cuidado e limpo e, mesmo assim, estava a arder. Não sei dizer se estava, ou não, bem ordenado. Vamos partir do princípio que sim. Isso não invalida nada. Pelo contrário. O que aconteceu é que o fogo chegou à zona ordenada, alimentado e robustecido por vários quilómetros de floresta desordenada, habitada pela tradicional monocultura de espécies exóticas. E os problemas da floresta (como todos os outros) não se resolvem com condomínios de luxo, que não nos protegem de coisa nenhuma. Às vezes, pode ser injusto. Mas, o contrário também seria.
"Adoro o cheiro a napalm pela manhã" é das frases mais célebres do cinema. Faz parte do filme de guerra "Apocalipse Now". E faz-me arrepios, há vários anos. Hoje, lembrei-me dela, porque acordei com o cheiro a fogo. Neste caso, não é um filme - é uma guerra antiga dos portugueses. Às vezes, penso que vou deixar de gostar do verão. Mas gosto demasiado de sol, de areia, de praia, de campo, de ar livre, de viagens, de férias. Porém, basta-me saber que os termómetros se aproximam dos 30 graus, para ficar ansioso. Com a chegada do calor, a questão não é saber se vamos ter incêndios. Vamos ter, de certeza. Resta saber quantos, onde e com que dimensão. Quando as coisas correm mal, abrem-se bocas e apontam-se dedos. Como se fosse surpreendente. Não é. Se quiserem coisas surpreendentes, vejam/revejam a obra-prima de Francis Ford Coppola: tem bombardeamentos com napalm, ao som das "Valquírias" de Wagner. Quanto à guerra dos portugueses, não é épica. É trágica.
… Foi então que Schindler descobriu o que lhe faltava: a guerra. Os negócios de Schindler prosperavam na Alemanha nazi. Era a primeira vez que tal lhe acontecia. Arranjou um gestor judeu e centenas de judeus, que trabalhavam, de graça, na sua fábrica. Schindler fumava, bebia, publicitava, subornava, e fechava negócios com os nazis. Schindler enriquecia. Os judeus mantinham-se vivos. Todos ganhavam.
Penso em Schindler quando há crises económicas. Ninguém tem culpa de ser pobre. Ninguém tem culpa de ser rico. Mas, quando se enriquece em tempos de crise, a coisa custa mais. Porque fica a sensação que uns lucram com o empobrecimento dos outros. Quantas vezes não ouvimos que a compra de habitação e automóveis de luxo cresce, enquanto a economia se afunda e o desemprego dispara. São negócios da guerra.
Ontem, voltei a pensar em Schindler. Por estes dias, arderam terras e casas e carros e animais. Ardeu gente. E há quem aproveita as casas vazias, para roubar; e quem se faça passar por funcionário da Segurança Social, para roubar. Como se estivéssemos na guerra: na guerra do Schindler.