Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Despedido

por Miguel Bastos, em 05.12.23

george clooney.jpeg 

Alguma vez foram despedidos? Eu já. Viram o filme "Nas Nuvens"? Eu vi. No filme, George Clooney é um especialista em despedimentos (claro que a profissão tem outro nome, é um perito em "downsizing"). Diz o especialista: "Trabalho para uma empresa que me cede a cobardes, que não têm coragem para despedir os seus próprios funcionários". E explica que têm boas razões para isso: "Porque as pessoas fazem coisas loucas, quando são despedidas". O George ainda não sabe, mas o seu lugar também está a ser colocado em causa. No meu caso, eu também não sabia, mas já desconfiava.
 
Há uns anos, tive direito ao meu George. Claro que não tinha a pinta do original, mas, mesmo assim, tinha a sua pinta. Vou-lhe chamar Jorge (à portuguesa) e adiantar que usava dois sobrenomes - condição importante para perceber a combinação que fazia entre o militar disciplinado e o "cowboy" insolente. Um beto, que dizia palavrões em telefonemas de trabalho. Um profissional, que tratava as pessoas por "você" em "tefonemas" pessoais.
 
A conversa do Jorge foi breve: "Vamos lá a isto"; "Aqui está o contrato de rescisão"; "Este é o valor de indeminização, obrigatório por lei"; "Esta é a carta para o desemprego". Depois, veio um aperto de mão, a transmitir confiança, acompanhado de um "Boa sorte" e, finalmente, um "Vemo-nos por aí". Aqui, não resisti e devolvi-lhe um sorriso amarelo, acompanhado de um "Nós nunca mais nos vamos ver, pois não?". Respondeu-me um vacilante "Nunca se sabe...", que eu atalho dizendo-lhe nos olhos: "Ouve, Jorge, eu sei que o teu trabalho é despedir pessoas e que estás a tentar ser o mais profissional possível. Mas esta era a minha vida. E, agora, acabou. E, a menos que mandem alguém, como tu, para acabar com a tua, nós não nos vamos voltar a encontrar, pois não?". "Não percebi", diz o Jorge a tentar recuperar o equilíbrio. "Se fores despedido, podemo-nos encontrar no Centro de Emprego ou na Segurança Social ou assim. Caso contrário, é pouco provável, não é?". O Jorge esboçou um sorriso e despediu-se. Mas só de mim. Como nunca mais o vi, presumo que continue a trabalhar.

Autoria e outros dados (tags, etc)

A burra

por Miguel Bastos, em 11.04.23

burra.jpg 

Saímos do cinema, a meio do filme. "Irreversível", de Gaspar Noé, tinha sido anunciado como um "filme-choque" (coisa que, normalmente, não me agrada), mas estava coberto de boas críticas e de recomendações de amigos. Tentámos a nossa sorte, numa tarde de domingo. O filme avançava, em espiral, praticamente sem imagem, mas explicitando tudo em som: sexo, violência e terror. Confirmou-se: "filme-choque". Saímos, a meio, atordoados, com a cabeça e o estômago às voltas. Saímos para a avenida. Caminhámos, vagarosamente. O ar fresco e o bom tempo foram-nos recompondo. Olhámos um para o outro, à porta do museu: uma retrospetiva de um artista contemporâneo. "Entramos?". Entrámos. "Artista provocador, que aborda a sensualidade e a sexualidade, de forma crua, irreverente e provocadora. Um olhar inquietante e blá, blá, blá, e blá, blá, blá". Instalou-se, de novo, a sensação de enjoo. Voltámos para casa. Comemos em frente à televisão, na companhia de um programa de canções. Parece que um dos concorrentes tem uma burra. "Tens uma burra?", pergunta a Catarina. "Tenho". "Eu também. Podíamos juntar as duas, para ver se acasalavam". Rompemos numa gargalhada. "Ai, que parvoíce", diz a Catarina, "se são duas burras, não podem acasalar". Voltámos a rir. Tanto e tão alto, que (soubemos depois) deixámos a vizinhança preocupada. Não sei se estão a ver o filme: ligar a televisão foi a decisão mais inteligente do dia. Fomos salvos pela burra da Catarina.

Autoria e outros dados (tags, etc)

O menino dos filmes

por Miguel Bastos, em 13.03.23

 

Era uma vez um filme. Nesse filme, havia um menino que gostava de fazer filmes. Fazia filmes, para lidar com a realidade. Fazia filmes, para fugir da realidade. Fazia filmes, para aumentar, diminuir, distorcer a realidade - de acordo com o seu desejo. Esse filme, sobre o menino que fazia filmes, é de Steven Spielberg. E toda a gente percebe que aquele menino é ele próprio, dentro de um filme. É ele, próprio, menino: a sonhar cinema, a pensar cinema, a fazer cinema. É o cinema entre a razão e o coração, entre a arte e a técnica, entre a memória e a criação.
Ontem, o filme passou despercebido nos Óscares. Como não sou cinéfilo, nem costumo seguir a cerimónia dos Óscares, não entro na discussão sobre qual era o melhor filme e se houve, ou não, justiça nos prémios atribuídos. Só sei que "The Fabelmans" é um filme muito bonito e não devia passar despercebido. Um filme que ajuda a perceber o Spielberg criador - o seu cinema, mas, também, o cinema em si.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Dentes pretos

por Miguel Bastos, em 20.01.23

terror grande.jpg 

Depois do papel higiénico preto, eis que inventaram a pasta de dentes preta. Muito giro. Deixa os dentes pretos, para brincar aos filmes de terror. Deixa o lavatório preto, para brincar aos mecânicos da Marateca. Depois, é brincar às lavadeiras de Caneças, na Aldeia da Louça Branca: "Água fria, da ribeira..."   

Autoria e outros dados (tags, etc)

Um dia inesquecível

por Miguel Bastos, em 26.09.22

dia inesquecivel.jpg 

Antonietta (Sophia Loren) acorda numa casa cheia de filhos. É dona de casa, diríamos nós. Um nome que se dá (ironicamente) a quem não é dono de nada: nem si próprio. Para ela, vai ser mais um dia como os outros. Para a família, que prepara com zelo, será "Um Dia Inesquecível". O dia em que Mussolini irá receber Adolf Hitler, com pompa e circunstância. O filme de Ettore Scola, não vai mostrar, no entanto, a Roma imperial em festa. Adivinham-se paradas militares, banhos de multidão, encontros palacianos. Mas, da festa, chega apenas o som, emitido pelos altifalantes. O som rodeia os únicos personagens que ficam em casa, num prédio, agora vazio: Antonietta e Gabrielle (Marcello Mastroianni). O som vai-se desvanecendo, à medida que os personagens vão mergulhando, um no outro e dentro de si próprios. No final do dia, "inesquecível", Antonietta irá voltar à algazarra que lhe esvazia a vida; Gabrielle irá partir, escoltado pela polícia, para o que, na melhor das hipóteses, será um exílio. Está visto, a história (não vou contar detalhes) não acaba bem. A Itália (sabemos, da história) não acabou bem. A Itália acorda, hoje, com saudades não sei de quê.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Divórcio

por Miguel Bastos, em 21.04.22

macron le pen.jpg

Estou a ver o noticiário, na televisão. Em rodapé, anuncia-se o novo filme de António Pedro Vasconcelos, sobre o tema do divórcio. Olho para ecrã. Sóbrio e elegante, um casal de meia idade senta-se, frente a frente. Discutem os problemas que os apoquentam. Separam-nos umas mesinhas, pequenas, e um mundo, imenso: as contas do gás, da eletricidade, a economia doméstica, e a russa que se meteu entre eles. "Eu sou uma mulher livre", diz ela. "Pronto, está consumada a separação", penso em voz alta. Mas, subitamente, pinta um clima. Sim, um clima. "Quem lá ver...", penso, de novo, em voz alta. "Você é uma climo-cética!", atira ele. "E você é um climo-hipócrita", responde ela. O ambiente não está nada bom. Desligo o televisor.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Filme para adultos

por Miguel Bastos, em 10.02.22

"Filme para adultos". Acho graça ao eufemismo. Parece que os adultos só veem um tipo de filmes. O que, convenhamos, é uma ideia muito infantil.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Festas, festas

por Miguel Bastos, em 31.01.22

Boris Johnson comentou, há pouco, no parlamento, o inquérito ao "Partygate".
Eu também gosto muito de festas. Sou um pândego, um galhofeiro, um folião. Mas só em part-time. A tempo inteiro - 24 horas por dia - e em tempo de pandemia, não é para todos. Aliás, o problema é que não foi para todos. Foi, mesmo, só para alguns. Parece coisa de filme.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Sem legendas

por Miguel Bastos, em 07.04.21

Mais velho - Acho que não gostei muito do filme.
Mais novo - Eu gostei.
Mais velho - Achei um bocado esquisito.
Mais novo - Porquê?
Mais velho - Não sei. Talvez porque, como não tinha diálogos...
Mais novo - Por isso é que eu gostei...
Mais velho - acabei por não perceber muito bem a história.
Mais novo - não tinha aquelas coisas em baixo para ler.
Mais velho - Hã?
Mais novo - Ai, credo, sou tão engraçado!

Autoria e outros dados (tags, etc)

Webinar

por Miguel Bastos, em 11.09.20

vhs.jpg

Gosto desta palavra. É nova, mas faz-me lembrar os videoclubes dos anos 80. Fico sempre a pensar que, depois de ver o "webinar", tenho de rebobinar até ao início. É uma questão de respeito pelos outros. E de evitar multas.

Autoria e outros dados (tags, etc)


Mais sobre mim

foto do autor


Calendário

Março 2024

D S T Q Q S S
12
3456789
10111213141516
17181920212223
24252627282930
31

Pesquisar

  Pesquisar no Blog

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D