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"Ai, queridos, estou tão triste. O meu Balsemãozinho vai-nos vender a todos!" A nossa camarada tinha todas as razões para estar triste. O último grande patrão dos media preparava-se, na altura, para vender todas as revistas do grupo Impresa. "Sabe-se lá, para quem é que vamos trabalhar..." Esse era, de facto, um grande problema. E continua a ser. Para o melhor e para o pior, sabia-se de quem eram as revistas. Quem era o "patrão". A quem é que se devia dirigir os elogios. A quem é que se podia fazer críticas, pedir responsabilidades e exigir explicações. Os grandes patrões dos media têm vindo a ser substituídos pela mão invisível do capitalismo financeiro. Sem rosto. Cada vez mais, os jornalistas, essenciais para o escrutínio da democracia, trabalham para organizações que são muito pouco escrutinadas e muito pouco escrutináveis. São fundos, que detêm empresas, que controlam outras empresas, que se dizem donos das empresas de media. O que poderão dizer, atualmente, os jornalistas com a vida em suspenso: "Ai, a minha "comparticipadazinha", com capitais de risco, vai-nos vender a todos" ou "Ai, o meu "offshorezinho" vai-me despedir"?
"A rádio dá a ver. Pode parecer obsceno, mas muitas vezes a rádio consegue dar a ver com maior eficácia, com maior verdade, do que a televisão." Fernando Alves, no Público. Estou a ver a rádio, no jornal.
Por um lado, faço um esforço por estar, cada vez mais, atento à atualidade. Por outro, aprecio, cada vez mais, a minha "distração". Há pouco, apercebi-me que hoje não tinha passado os olhos pelo Diário de Notícias. Agora, acabo de me aperceber que estou a ler o jornal de segunda-feira. Não lamento. Pelo contrário. Acabo de ler a coluna do jornalista Paulo Baldaia "Isto ainda não é a Ucrânia". Alerta o autor que a presença da embaixadora da Ucrânia no desfile "alternativo" do 25 de Abril, protagonizado pela Iniciativa Liberal, e a sugestão da ilegalização do PCP, por parte do presidente da Associação dos Refugiados Ucranianos, são muito questionáveis. Num tempo de trincheiras, Paulo Baldaia recorre a uma expressão que associo à tropa que não fiz: "à vontade não é à vontadinha". Lembra, a seguir, que, em Portugal, não está em curso qualquer "processo de descomunização". E, depois, defende a liberdade. A mesma liberdade que usa, para criticar o PCP. A mesma liberdade que usa, para apoiar o povo ucraniano. A mesma liberdade: para criticar o governo russo ou o governo ucraniano. A liberdade devia ser igual para todos. Mas sabemos, todos, que não é.
Pode ler o artigo aqui:
https://www.dn.pt/opiniao/isto-ainda-nao-e-a-ucrania-14816661.html
A "questão dos chamados 'votos desperdiçados'", escreve Ribeiro e Castro, hoje no DN, "Não é uma questão nova". O nome histórico do CDS explica porque é que há sempre votos que não são convertidos em mandatos. Pedagogicamente, aborda as vantagens e desvantagens dos sistemas maioritários e dos sistemas proporcionais. No primeiro caso, quem ganha, ganha tudo - mesmo que seja por 1% - o quer dizer que pode haver 49% (ou 56% ou 75%) de "votos desperdiçados". No segundo, a questão, sendo atenuada, não desaparece. Isso deve-se a dois fatores: a matemática ("inexorável", escreve o autor) e a democracia ("onde há uns que ganham; e outros que perdem"). Para além da representatividade, Ribeiro e Castro está preocupado com a governabilidade, que seria posta em causa com uma excessiva dispersão dos votos: "Nesse caso, não seriam só os votos que iriam 'para o lixo', mas talvez toda a democracia".
Normalmente, o lançamento de um disco não é assunto de noticiário. E nunca é abertura de noticiário. Mas, há 30 anos, foi. Lembro-me da TSF abrir o noticiário das 8 com guitarras distorcidas, sons industriais, eletrónica ambiental, ritmos tribais a desaguar na dança, e uma voz carregada de efeitos. Um OVNI, na rádio portuguesa. Um OVNI planetário, soube depois. Os pacifistas U2 desencadearam uma espécie de blitzkrieg artística. Eu, que era leitor do Blitz (e do Sete, do Público, do DN, do Expresso, e do NME e do Melody Maker...), fui apanhado pelo ataque surpresa. Os U2 mudaram tudo: da luz do sol, para as luzes de néon; da América para a Europa; do deserto para a metrópole; da flanela para o nylon; do rock puro e duro, para o rock sujo, industrial, eletrónico, rítmico, pulsante. Olhei, boquiaberto, para Bono - maquilhado, com óculos de mosca, repleto de brilhos - e esfreguei os olhos e os óculos. Um Bono mais Bowie do que Dylan. Nunca visto, nunca ouvido.
Sempre que me dizem que o jornalismo português é "muito à esquerda", tendo a sorrir. O jornalismo e os jornalistas podem e devem ser criticados e escrutinados. Mas, tão ou mais importante, é saber quem detém os órgãos de comunicação social. São esses que depois escolhem administradores e diretores, que definem as políticas editoriais. A máxima "follow the money / sigam o dinheiro" - usado nas ciências políticas - aplica-se aqui, em todo o seu esplendor. E os patrões dos media estão, de modo geral, muito longe de serem "muito à esquerda". Recentemente, o setor sofreu muitas alterações: da restruturação dos grupos Impresa e Media Capital; à consolidação do grupo Cofina no setor televisivo; passando pelas transformações recentes com a entrada do grupo BEL, no grupo Global Media. É sobre este grupo (que detém o JN, o DN, O Jogo e a TSF) que o jornalista Miguel Carvalho se debruça, esta semana, na Visão: com uma investigação sobre o novo "tubarão dos media", Mário Galinha. Parece canja, mas não é.
Estou, aqui, a olhar para a capa da Visão. Está uma riqueza. Estão várias, até.
Leio e despeço-me do Diário de Notícias, em papel. Este Diário de Notícias vai acabar. Não sei, ainda, como é que vai ser o novo. Sei, apenas, que vai ser outra coisa. Esta manhã, Ferreira Fernandes esteve na Antena 1 a explicar que jornal é esse que vai nascer. Ele, que lia três jornais em papel todos os dias, sabe que há gente que ainda o faz. Não é, no entanto, gente que chegue para alimentar o jornal que dirige.
Eu leio jornais online para saber das últimas notícias, com rapidez. Mas não leio textos de 30 ou 40 mil caracteres: entrevistas, reportagens, opinião. Há quem leia, claro. Mas, acredito que serão poucos. E se é verdade que o mundo - cada vez mais rápido - não espera pelo dia de amanhã; também é verdade que o mundo - cada mais complexo - continua a não caber em meia dúzia de palavras.
Acho, por isso, que passar para o online não é construir um futuro mais rico, é adaptarmo-nos a um presente mais pobre. Não há jornais a mais, em Portugal. Há é leitores a menos. E, quanto a isso, só nos podemos queixar de nós próprios. E agora, com a vossa licença, vou ler o jornal em papel. Enquanto existe. Boa sorte para o DN.
Comissão de Inquérito às rendas da EDP. Novidade: o DN avança que o Bloco de Esquerda quer ouvir Vitorino. Não diz nada sobre ouvir Janita Salomé. É pena.