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Umas das coisas que sempre me impressionou nos filmes da Segunda Guerra Mundial é a forma como as pessoas continuam a viver: afogadas nas pequenas coisas do quotidiano, indiferentes ao nazismo - mesmo quando ele já se materializa em guerra. Até que, de repente ficam sem trabalho, sem casa, sem direitos, sem filhos, sem pais, sem vida. É sempre inquietante para nós, que já sabemos o fim da história, assistirmos ao comportamento daquela gente. No caso de Else - mulher, alemã, judia, casada com um cristão da alta burguesia - nada conseguia abalar a sua vida burguesa, boémia e frívola: com direito a festas, vestidos, espectáculos e amantes. Mesmo quando teve que abandonar a Alemanha e instalar-se na Bulgária, continuou a ter uma vida irreal: vivia numa casa com empregada, passava férias na praia. Até que o cerco apertou e ela foi perdendo tudo: uma coisa de cada vez.
O livro “Tu não és como as outras mães”, de Angelika Schrobsdorff, fala desta mulher (Else, a mãe da autora) que, apesar de ter abandonado a fé judaica, será sempre considerada uma judia e sofrer, na pele, as consequências da sua condição. Mas, o que achei mais chocante é que o livro não acaba com o fim da Segunda Guerra Mundial, com o habitual direito à vitória da justiça, à catarse, à felicidade. E, ao estender-se no pós-guerra, assistimos, através dos olhos de Else - mulher profundamente transformada pela guerra - à repetição dos mesmos comportamentos, da mesquinhez, dos vícios que existiam antes da guerra. Como se os seres humanos (todos nós) fossemos incapazes de aprender a viver, apenas para sobreviver.