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Entrei e olhei à volta. Tentei escolher um bom lugar, ao pé da janela. Normalmente, tento seguir a máxima da canção e procuro uma “janela virada para o mar”. Sentei-me e, enquanto procurava o meu livro, olhei para o lado. A senhora, ao meu lado, estava a ler. Não é verdade que o ser humano só tenha olhos para acidentes e desgraças. Existe, por exemplo, uma enorme curiosidade por tentar ver o jornal ou o livro do vizinho. Como se os livros, fossem janelas, que os outros abrissem para nós. A senhora ao meu lado lia Tolstói.
“Que engraçado”, disse eu “também estou a ler um livro de um autor russo”. Ela sorriu, fechando ligeiramente o livro, deixando o polegar esquerdo a marcar a página, e mostrou-me a capa de Ana Karenina. Então, estendi-lhe o meu Nabokov e senti uma certa cumplicidade. “Sabe que nunca li nada dele?”, disse ela. E, assim, dois estranhos seguiram, lado a lado, cada um com o seu russo. E eu a hesitar se devia olhar para o meu russo ou falar dos russos com a vizinha. Depois, o comboio parou e a senhora saiu. E eu olhei para o meu Nabokov que dizia “Não, eu não pronunciei nenhuma destas palavras”. Eu também não. Mas, gostaria.