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Quando fez 60 anos, a norte, a minha RTP escreveu o nome dos seus trabalhadores na parede. O meu nome está lá. E não está só, está bem acompanhado. Tenho orgulho de ter o meu nome escrito naquela parede, no local onde trabalhei quase 8 anos. Vou continuar a trabalhar na Rádio e Televisão de Portugal, apenas mais longe desta parede. Portanto, não há motivo para dramas. Eu é que sou um lamechas, agarrado às pessoas e aos locais onde habito. Onde tenho habitado. Trabalhado. Se pensar bem, a minha casa continua a ser a mesma - a Rádio Pública - só mudo de turma. Já nos encontramos, no recreio. Até já.
"Isto é muito estranho", disse a convidada, "porque eu estou a falar com o João Gobern, mas ele não está aqui". "Estou, estou", disse o João, "garanto-lhe que estou". "Eu vou explicar aos ouvintes", continuou a convidada, "eu estou no estúdio, em Lisboa, com a Margarida à minha frente, mas o João está no Porto. E eu tenho de ter uns auscultadores, na cabeça, para o ouvir. Isto é surreal!". "Não é nada surreal", pensei, "é rádio". A rádio convive, desde sempre, com vozes à distância. A pandemia trouxe a democratização/banalização (riscar o que não interessa) das vozes à distância. Mas elas fazem parte da história e da paisagem sonora da rádio. E, no caso português, da prática diária das rádios do serviço público. Esta semana, tenho "contracenado" com o André Santos, na Antena 3. Hoje, juntámo-nos, pela primeira vez, em estúdio. Aliás, nunca tínhamos estado juntos, fisicamente, no mesmo espaço. É "surreal"?! Não, não: é rádio.
Acordar na noite escura
Chegar à redação
Descobrir um colega doente
Editar a Antena 3
Enfim, a alegria no trabalho.
Um dia destes, farei um texto espetacular sobre a dignidade no trabalho. Será uma coisa como deve ser: bem pensada, bem escrita, com citações eruditas e notas de rodapé. Infelizmente, agora não tenho tempo. Tenho que pôr estas almofadas na cama, coitadas!
- Olá, Vítor, estou a chegar!
- Ótimo, eu também estou a chegar.
- Calculei. Tenho ideia que acabei de o ver.
- A sério?
- Sim, ali na esquina do mercado.
- Vinha a comer uma banana?
- Acho que sim.
- Então, era eu.
Que bela forma de começar o encontro com o coreógrafo Vítor Roriz, que veio para o Festival. Serpenteámos as ruas da pequena localidade de Pujaut, até encontrar a correta. Subimos a pé, até ao local onde iria apresentar a sua performance, sob o som, ensurdecedor, das cigarras e o sol, inclemente, de Avignon. Ao todo, a atividade demora 7 horas, com pausa para o almoço. Mas eu tenho, apenas, um minuto e meio para contar a história, sem pausa para jantar.
Era meia-noite e meia, em Avignon, quando a encenadora francesa Julie Deliquet atravessou o palco do Cour d’ Honneur, do Palácio dos Papas, de braço dado com o realizador norte-americano Frederick Wiseman, de 93 anos.
Ao final da manhã, a dupla já estava sentada, no Pátio dos Claustros de São Luís para um Café das Ideias, um espaço de debate e convívio do Festival.
Para aqui chegar precisei de 3 cafés. Estou um trapo. O senhor de 93 anos (pelo contrário) parece impecável. Confirma-se: os 90 são os novos 50. E vice-versa.
Hoje, estacionado na Antena 2. Próxima estação, Antena 3.
- Quem é que escolheu este canal?
- Não sei. Queres que peça para mudar?
- Está bom. Não há paciência para aquelas coisas no parlamento.
- Pois.
- Acham, mesmo, que os portugueses têm paciência para aquilo? Os portugueses querem é saber da economia, do emprego, da educação, da saúde...
- O que é que estás a fazer?
- Vou só espreitar o telefone, porquê?
- Porque deves ser espanhol.
- Não percebi.
- "Os portugueses querem é saber da economia e do emprego..."
Ouço-me, nos arredores da cidade, com vista para um campo plantado com galinhas, sanitas e pneus. O encenador Ricardo Pais regressa ao Teatro Nacional de São João, casa que dirigiu durante 10 anos. O assunto é notícia. O trabalho de reportagem teve dois atos, com um longo interlúdio com o Presidente da República, no dia em que vetou a lei da eutanásia. Só retomei o trabalho sobre a peça de teatro, já cansado, ao final do dia. Daí a vontade de verificar, no dia seguinte. Será que ficou bem? Aparentemente, sim. No regresso a casa, puxo a emissão da Antena 2 atrás e ouço a voz de Ricardo Pais a abrir e, depois, a trespassar a manhã. Descanso, finalmente.
[Fotografia: Teatro Nacional de São João]
Para ouvir aqui (Reportagem aos 7'40''):