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"Você gosta de usar óculos?", perguntou-me o doutor do olhos - um senhor velhinho, de andar ligeiro e modos delicados. "Nem por isso", respondi. "E porque é que não faz uma operação? É um rapaz novo, tem a miopia estabilizada, ficava a ver melhor, devia pensar nisso". Pensei e agi, mas fui traído por um ligeiro aumento na graduação. Numa consulta mais recente, voltei ao assunto com o meu doutor. Arqueou as sobrancelhas, com um ar intrigado: "Uma operação, com a sua idade"? "Bem, foi o senhor que falou nessa hipótese". "A sério, isso foi há quanto tempo"? "Há uns dez anos, talvez". "Mas, que idade tem? Deve estar próximo dos 50". "Já estive mais longe", respondi. "E já não deve ver bem ao perto. Vamos já ver isso". Fez-me um teste, que passei com distinção. "Vê", disse o doutor compondo os seus óculos, "é uma vantagem de ser míope". "Haja alguma", acrescentei. "Mas não vale a pena pensar na operação, porque mais tarde ou mais cedo vai precisar de óculos para ver ao perto". Agradeci e abandonei o consultório. Há dez anos, eu era novo. Agora, já estou velho. Ao que parece, “dez anos é muito tempo” e não é só na canção.