por Miguel Bastos, em 27.08.18
Para que não restem dúvidas, acho que Carlos Paião era um génio. Muitos concordarão, muitos não. O próprio, creio eu, teria muita dificuldade em aceitar esta classificação. Paião não se levava muito a sério. E, talvez por isso, nunca tenha editado um disco à altura do seu talento, como referiu David Ferreira no texto que acompanha a compliação "Letra e Música - 25 Anos Depois". Amália foi a primeira a perceber o potencial de Paião e gravou o "Senhor extraterrestre", que Gisela João voltou, agora, a cantar.
Carlos Paião escreveu para várias pessoas. Ele escrevia muito e bem: letra e música. Era um jovem atento, com um olho clínico para os costumes nacionais e os temas da atualidade. Era irreverente, mas bem comportado. Escrevia de repente e por encomenda. Teve sucessos que permanecem na memória colectiva. Mas também canções menos conhecidas, que merecem ser redescobertas. Carminho recuperou, recentemente, "História linda". Nela, o jovem Carlos conta a história de amor dos pais. Fala da mãe, sempre aflita, porque o marido "tinha um emprego nas ondas do mar". Ironia do destino, o filho morreu pouco tempo depois. Em terra. Fez ontem 30 anos.
Não creio, no entanto, que Carlos Paião quisesse ser lembrado por coisas tristes. Ele tinha imensa graça. E, por isso mesmo, acho devia ser levado mais a sério.