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O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, deu ordem ao exército para atirar sobre os refugiados. Uma “Licença para matar”, como o James Bond? Até tremi.
Bem, o agente 007 só usa a sua “Licença para matar” porque existem uns maus, que querem roubar, enriquecer, matar e controlar o mundo. Olhando para os refugiados, que tentam atravessar a Europa, é difícil ver um exército de maus. É ao contrário, senhor Orbán: eles fogem dos maus.
Depois, Bond está sempre do lado certo, com o estilo certo. Veste bem, caminha com elegância, conduz como um piloto de Fórmula 1, dispara como um sniper, fala como um líder, luta como um herói. O senhor Orbán não tem nada disto. Os seu fatos e as suas leis europeias não conseguem escondem os seus tiques autoritários, xenófobos e anti-democráticos.
No fim, descobrimos que não há “Licença para matar”. Só para atirar: num braço, numa perna ou coisa assim. Saio do James Bond e entro diretamente no universo de Raúl Solnado. Na sua chamada para “Vachintom”, Solnado oferecia os serviços do exército de Ranholas que tem “um soldado baixinho que, em vez de disparar, insulta. Bem, ele não mata. Mas ele desmoraliza muito.” O Solnado faz falta à Europa.
O Syriza voltou a ganhar as eleições na Grécia. Há menos de um ano, o partido de Tsipras representou uma nova esperança para a Europa. Agora a vitória passou despercebida. Porquê?
Porque, geralmente, só temos capacidade para pensar num assunto. Dois ou três, no máximo. E, agora, temos as eleições em Portugal e a crise dos refugiados. Portanto, temos mais em que pensar. Claro que há quem lembre as alegrias do Bloco e de António Costa com a vitória do Syriza. Claro que há quem insista que “Portugal não é a Grécia”. Claro que há quem a lembre a Grécia, a propósito da falta de respostas da Europa à crise dos refugiados.
Ora, apesar do terceiro resgate, da austeridade, da cisão interna, das filas para o multibanco, Tsipras ganhou as eleições. Ganhou mesmo, claramente. Não houve o empate com a Nova Democracia, antecipado pelas sondagens; nem o desaparecimento do Syriza, decretado por Varoufakis. A Nova Democracia teve menos votos, os dissidentes do Syriza saíram do parlamento.
Tsipras ganhou e já anunciou um novo governo, em coligação com os Gregos Independentes. A empatar há demasiado tempo, vamos ver se é desta que a Grécia desempata.
Primeiro, a Europa fez de conta que não viu. Depois, era um problema dos países do sul. Quando os refugiados chegaram, em massa, a França e à Hungria a coisa começou a mudar. Em França, os refugiados perceberam que a “Igualdade, Liberdade e Fraternidade” tem dias e que, do outro lado de Calais, não há oásis, só mau tempo no canal. Na Hungria, deram de caras com um líder político que, de urbano, só tem o nome. Orban ergueu um muro, esquecendo que já esteve do outro lado de um.
Cameron não se distingue muito. Como Orban, gosta de estar com um pé dentro e outro fora da Europa e lembra que o seu reino não tem espaço para Schengen. Angela Merkel tem estado sozinha e também veio dizer “já Schengen”. A poderosa Alemanha não consegue convencer os parceiros europeus a receber refugiados e também fecha as fronteiras.
A Europa não tem memória, nem pensamento, nem discurso, nem liderança. Tem porteiros.
“Já Schengen” é a resposta da Europa à Crise dos Refugiados. O último que feche a porta.
O jogo já tem barbas. Uma pessoa esconde um objeto, a outra tem de o encontrar. A primeira ajuda a segunda com as indicações: “Quente”, “Frio”, “Gelado”. Também dá para se fazer o jogo com um facto ou com um pensamento. Por exemplo: “Adivinha quem é que eu vi hoje de manhã” ou “Adivinha quem é que ganhou o debate…”
O debate foi ontem. Passos Coelho e António Costa, perante três jornalistas, em simultâneo nas três televisões. As televisões venderam-nos “o debate decisivo”e exploraram o facto de “pela primeira vez, os dois principais candidatos debatem, em simultâneo, nos três canais de televisão”.
Para alimentar o “acontecimento”, houve uma grande aposta na análise e descrição dos bastidores do debate. Na TVI, José Alberto Carvalho falou, com Marcelo Rebelo de Sousa, sobre o nervosismo antes dos debates. Na SIC, Pedro Mourinho perguntou a António Vitorino e a Santana Lopes, se costumavam fazer exigências para os debates. Como as estrelas de rock, antes dos concertos. É que…
para o debate, António Costa pediu ambiente frio e Passos Coelho pediu água gelada. O resultado foi morno. Só podia ser…
Durante as férias, temos mais tempo para conversar. Com a nora do Senhor Rodrigues, por exemplo. A conversa passou por Londres, onde a senhora viveu. Foi emigrante.
Alguém falou do ambiente cosmopolita de Londres: diferentes etnias, religiões, cores de pele, orientação sexual, línguas, sotaques. O postal turístico de uma grande cidade europeia. Mas, rapidamente, a coisa evoluiu para os que não se querem integrar, que não trabalham, que vivem da segurança social, que se reproduzem como coelhos, etc. Numa altura em que o Eurotúnel está entupido e Calais rodeado de arame farpado, eis o emigrante, com um discurso racista.
Infelizmente, não surpreende. Há uns anos vi emigrantes portugueses em França, numa manifestação de apoio à Frente Nacional. “Então mas os senhores apoiam um partido que é contra os emigrares?”, perguntava um repórter da RTP. “O Le Pen gosta dos portugueses. Ele não gosta é dos ‘magrebes’, que vêm para cá e não querem trabalhar”. Pois, é sempre assim. São sempre os outros.
Será que a imagem de uma criança morta a dar à costa, na Turquia, muda alguma coisa?